segunda-feira, 20 de junho de 2011

Adoecimento e perda da autonomia


O que significa perder a autonomia? Após adoecimento grave, geralmente o indivíduo vivencia sucessivas mudanças, que podem desencadear um processo de perda da autonomia, decorrente da necessidade de receber ajuda ou cuidado de outra pessoa e torná-lo dependente de alguém; ou ainda, pela impossibilidade de realizar atividades ou escolhas sem restrições. Neste caso, o indivíduo autônomo é responsável por si mesmo, capaz de cuidar de si ou de exercer papel ativo em sua própria vida.

Porém, quando a doença chega e junto as limitações, nem sempre se tem a escolha de recusar ajuda ou de realizar sozinho atividades pessoais ou particulares. O sentimento de inutilidade ou improdutividade é penoso, pode despertar reações emocionais negativas, sentimentos e pensamentos que intensificam a dor das perdas e gera culpa em grande parte dos pacientes. É comum ouvir de pacientes que sempre foram pessoas ativas ou independentes, que agora eles se sentem como se fossem um "peso" para seus familiares ou cuidadores.

Algumas perdas são temporárias, outras são permanentes. Mesmo que seja apenas por um período, muitas vezes é necessária uma reorganização familiar, uma mudança de papeis ou de rotina diária na vida do sujeito cuidador, para que esteja presente e consiga atender as atuais necessidades do indivíduo doente. TODA perda significativa gera sofrimento e requer cuidado para elaboração. Elaborar é um processo de reorganização psíquica e funcional. Emoções e hábitos de vida sofrem mudanças e se reorganizam para amenizar o sofrimento.

Atendo pacientes gravemente enfermos que lutam para vencer o sofrimento interno e as dificuldades externas no dia a dia, de inúmeras limitações ou perdas pelo adoecimento. Cito alguns para favorecer a reflexão a respeito do tema.

Uma paciente obesa mórbida, que perdeu sua autonomia e depende de alguém para realizar sua higiene pessoal (tomar banho, ir ao banheiro), para caminhar, se levantar, para se alimentar; pois já não consegue realizar nenhuma atividade sozinha.

Uma familiar que é cuidadora de um paciente com Doença de Alzheimer, este que está cada vez mais dependente de seus cuidados, tornando a vida da cuidadora, mais e mais restrita, comprometendo seu autocuidado e gerando sobrecarga física e emocional.

Um paciente adolescente que neste momento está em tratamento para Leucemia, que sofre pelas restrições e diversas mudanças em sua vida, doença que o impossibilita de continuar como goleiro do time de bairro que tanto ama, do qual faz parte desde menino.

Um paciente que está gravemente adoecido e tornou-se totalmente dependente de cuidado, deixando de exercer o papel de cuidador da sua família, sentindo-se inútil e incapaz de cuidar dos que tanto ama.

Para esses indivíduos, de todas as idades, que sentem-se invadidos pelo sofrimento de perdas geradas após a descoberta de uma doença grave, é importante oferecer um cuidado respeitoso, que não comprometa o direito de escolha dessas pessoas. É possível ajudar ou cuidar, sem inutilizar alguém. Podemos executar algo para alguém, estando atento aos seus desejos e necessidades, sem imposições ou desrespeito, desvalorização do outro enquanto ser pensante e detentor de escolhas.

O paciente demenciado perde gradativamente sua função cognitiva ou pensante, mas enquanto consegue realizar algumas atividades mesmo que supervisionado, é importante que seja estimulado a continuar até que de fato, perca essa habilidade.

O apoio psicológico faz parte do acompanhamento de pacientes e familiares, para favorecer a adesão ao tratamento da doença física, para previnir ou cuidar do sofrimento e adoecimento emocional, contribuindo para a reorganização de papéis e elaboração das perdas inevitáveis.

Abraços fortes...

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