sexta-feira, 29 de julho de 2011

Infância e adoecimento



Infelizmente criança também adoece! Sempre ouço das pessoas que sabem que trabalho com crianças gravemente enfermas, que não aguentariam ver crianças tão doentes e correndo risco de morte. Mesmo para quem atua em Pediatria por opção e amor ao que faz, vivemos momentos de grande sofrimento e lamentamos que em alguns casos, a recuperação e retorno para casa não aconteça como o desejado.

Da mesma forma que os adultos, crianças quando adoecem gravemente vivenciam uma série de perdas e/ou mudanças que nem sempre serão temporárias ou a curto prazo. Muitas vezes, mesmo após a alta hospitalar, necessitam permanecer em cuidados, o que exige delas e principalmente de seus responsáveis (pais e outros familiares) mudanças rotineiras que talvez não fizessem tanta diferença, mas que agora diante da proibição ou impossibilidade... começam a fazer muita diferença.

Para que uma criança consiga aprender a ter cuidados com sua saúde é necessário um comprometimento de sua família e das demais pessoas que fazem parte de sua vida, nos diversos ambientes em que habita. Recentemente cuidei de duas crianças, na UTI pediátrica do hospital onde trabalho e as duas estavam bem de saúde, até que descobriram-se doentes, necessitando se adaptar às perdas geradas pelo adoecimento.

Uma das perdas mais significativas foi a mudança na alimentação. Uma das crianças com idade de 8 anos, estava com os rins comprometidos e ficou proibida de ingerir sal, necessitando de grande ingestão de líquidos, passou por diálise e permaneceu quase 1 mês internada. Diante de tudo isso, a restrição alimentar foi mesmo tão significativa? Claro que sim. Ela não era gordinha, mas como toda criança, sempre gostou de comer salgadinhos, adora coxinha e pizza, e tudo mais que neste momento lhe foi retirado, sem aviso prévio ou possibilidade de preparação.

A outra criança, ainda internada, vivencia um momento de intensas mudanças aos 5 anos de idade. Está internada por uma grave descompensação de diabetes mellitus. Se alimentava como qualquer outra criança e adora comer doces, sorvetes e bolos. Também não é gordinha e sempre foi de comer de tudo, mas agora o açúçar foi suspenso e essa menininha vai precisar tomar seu leite com adoçante.

Para muitos adultos, ter tantas restrições alimentares é bem difícil e gera sofrimento emocional, para essas crianças... como será conviver no dia a dia com outras pessoas que podem comer e sempre lhe ofereceram o que ela já não pode? E nas festinhas de família, na escola? Por isso, as mudanças principalmente nesta fase da infância, deverão ser incorporadas por todos os membros da família. As outras pessoas deverão receber desses pais orientação para evitar que favoreçam oferecendo alimentos prejudiciais a saúde.

Crianças e seus responsáveis necessitam de ajuda psicológica para conseguir enfrentar o adoecimento físico que além de colocar a vida da criança em risco, pode gerar estresse e descontrole ou sofrimento emocional em todos os envolvidos.

Minha paciente de 8 anos, passou dias difíceis em que sentia raiva por não perceber melhora rápida, triste e com saudades da sua casa e de seus familiares... seus amigos. Precisou de muito carinho e cuidado enquanto esteve internada para vencer os "bichinhos maus" que estavam em seus rins. Foi embora com um sorrisão no rosto e com seu livro de histórias infantis na mão.

A paciente de 5 anos continua internada, não quer nem falar da restrição alimentar, diz que é só a garganta que está doente e que quer muito sair para tomar sorvete. Vai precisar de muito carinho e cuidado também, dentro e fora do hospital. Sua vida daqui pra frente vai ser bem diferente! É uma menininha que possivelmente vai precisar de atendimento psicológico ambulatorial após sua alta.

Histórias de vida de pessoinhas que como gente grande já enfrentam muita dor física e emocional, lutando para voltar para suas vidas lá fora... Desejo que todas elas e suas famílias fiquem bem e sejam muito felizes!! Como disse Y. de 5 anos... "e a história termina assim... felizes para sempre!" Aos que não conseguiram este final feliz, meus sentimentos, digo a vocês que busquem ajuda psicológica para cuidar da dor pela perda de seus filhos. Já ouvi muitas vezes, de mães e pais, que não existe dor maior... nem mais destrutiva. 

Beijo no coração...

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